Todo pesquisador, ao realizar um estudo epidemiológico, pode estar sujeito a erros que podem interferir ou alterar o resultado. Aqui, veremos orientações sobre confiabilidade e o bom andamento do estudo.


As investigações epidemiológicas têm como objetivo fornecer medidas precisas da ocorrência de desfechos, porém, há muitas possibilidades de erro nessas medidas. Os epidemiologistas têm tentado minimizar esses erros e estimar o impacto daqueles que não podem ser eliminados. Os erros podem ser aleatórios ou sistemáticos. O erro aleatório pode ser caracterizado pela variação na medida de efeito, devido ao erro de amostragem. O erro aleatório reflete a precisão do estudo. Por outro lado, o erro sistemático expressa a diferença entre a medida real de efeito e aquela obtida no estudo. Pode ser devido à existência de vieses e de fatores de confusão. Os dois grandes tipos de vieses incluem o viés de seleção e o viés de informação. O erro aleatório nunca pode ser completamente eliminado porque quase sempre o estudo é conduzido em uma pequena amostra da população. O erro de amostragem decorre, geralmente, da falta de representatividade da amostra, que não contempla toda a variabilidade da população. A melhor forma de reduzir o erro de amostragem é aumentar o tamanho amostral. A variação individual sempre ocorre e nenhuma medida é perfeitamente precisa.

 

Vieses de seleção

Existem diversos tipos de vieses de seleção. Dentre eles, pode-se citar: o viés de amostragem, o viés de não-respondentes e o viés de perdas de acompanhamento. Neste sentido, o viés de amostragem ocorre quando certos indivíduos têm mais chance de serem selecionados em uma amostra aparentemente equiprobabilística. Por exemplo, em um estudo transversal sobre a prevalência da desnutrição em áreas rurais, os entrevistadores evitam as moradias isoladas e examinam somente crianças que moram próximo às estradas principais. O viés de não-respondentes pode ser encontrado em estudos transversais, onde os indivíduos não localizados apresentam, tipicamente, maiores prevalências da maioria de doenças do que os que são entrevistados. Em estudos de casos e controles, poderá haver viés se a taxa de não resposta for diferente entre casos e controles, e se a não-resposta estiver associada com a exposição. O viés de perdas de acompanhamento pode ocorrer em estudos de coorte ou de intervenção. Por exemplo, os indivíduos que deixam de ser acompanhados podem diferir daqueles que são efetivamente estudados. Isto pode distorcer as medidas de incidência e de efeito, caso as perdas estiverem associadas com a exposição.

 

Viés de informação

O viés de informação pode ocorrer quando a informação obtida sobre a exposição ou a doença pode distorcer os resultados do estudo. Alguns tipos específicos de vieses de informação são: viés de memória, viés do entrevistador e viés do instrumento. Em estudos transversais ou de caso-controle, pessoas afetadas por uma doença ou problema podem recordar melhor das exposições no passado do que pessoas não afetadas, sendo este caracterizado como um viés de memória. Por exemplo, pacientes com câncer de estômago podem se lembrar melhor de certas características da dieta no passado do que indivíduos sadios. No caso do viés do entrevistador, este poderá coletar as informações diferentemente para doentes e sadios, ou para expostos e não expostos. Um retrato disso pode ser que o entrevistador saiba que assistir televisão poderá aumentar o consumo de alimentos gordurosos e isso poderá ocasionar aumento da obesidade. Ao encontrar uma criança obesa, se esta não relata assistir televisão, o entrevistador insiste, tentando obter uma resposta positiva. Por último, o viés de instrumento pode ser caracterizado por um instrumento de medida que fornece resultados inadequados para um subgrupo de pacientes. Medir a pressão arterial com um aparelho comum em pessoas obesas leva a uma superestimava dos níveis pressóricos.

 

Fator de confusão

Um fator de confusão distorce uma associação real entre uma exposição e um desfecho. Em outras palavras, o efeito real de uma exposição sobre um desfecho pode estar aumentado ou diminuído devido à ação de outras variáveis (as chamadas confundidoras). Por exemplo, um estudo transversal mostrou que a presença de forno de micro-ondas no domicílio estava associada com maiores prevalências de obesidade infantil. Porém, famílias com alta renda têm maior probabilidade de possuir forno de micro-ondas, além de possuírem maior frequência de crianças obesas. De forma que a alta renda familiar não fazia parte da cadeia causal que ligaria forno de micro-ondas à obesidade. Portanto, a alta renda familiar pode confundir a associação entre forno de micro-ondas e obesidade infantil.

 

Métodos de controle

 Vários métodos estão disponíveis para controlar os fatores de confusão. Esses métodos podem ser utilizados tanto no delineamento do estudo quanto na análise dos resultados. O método mais comumente empregado para controlar os fatores de confusão no delineamento de um estudo é a randomização. Durante a análise dos resultados, os fatores de confusão podem ser controlados pela estratificação e modelagem estatística. A randomização, aplicável somente nos estudos experimentais, é o método ideal para assegurar que potenciais variáveis de confusão sejam igualmente distribuídos entre os grupos que estão sendo comparados. O tamanho da amostra tem de ser suficientemente grande para evitar a distribuição randômica inadequada dessas variáveis. A randomização evita que ocorra associação entre os potenciais variáveis de confusão e as exposições que estão sendo consideradas.

A epidemiologia clínica não é um jogo de encontrar erros. Tendo isso em mente, não é suficiente reconhecer que um viés poderia estar presente em um estudo. É preciso prosseguir, para determinar se o viés está, de fato, presente ou não em um estudo específico.

Além disso, é preciso decidir se as consequências do viés são suficientemente grandes para alterar as conclusões de forma clinicamente e, consequentemente a sua validade, tema este que será tratado na dica do próximo mês.



Por Tainah de Paula
Consultora
CAPCS / UERJ


Referências bibliográficas:
MEDRONHO R. Epidemiologia. Capítulo: 15 (275-288).
Fletcher RH, Fletcher SW. Epidemiologia clínica – elementos essenciais. 4. ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2006.