Cresce nos dias de hoje a necessidade dos escritórios e centros de apoio aos pesquisadores – congregando forças e capacidades em prol da pesquisa. Clareza de ideias, planejamento, adequação, trabalho de equipe multiprofissional, perseverança e apresentação de um orçamento criterioso e cuidadoso são atitudes decisivas para obtenção de financiamento de projetos.



Dentre os objetivos de um bom pesquisador, podemos citar a ampliação do poder diagnóstico, busca por tratamentos mais precisos, compreensão de novos processos e perspectivas em saúde, desenvolvimento da integridade intelectual e sensibilidade em prol de descobertas científicas que propiciem maior qualidade de vida às sociedades.

Mas, para bem vivenciá-los, o pesquisador precisa de tranquilidade e segurança para dedicar-se unicamente a seus estudos e análises – verticalizando sua mente brilhante à pesquisa em si e intuindo o legado que dela reverberará. Nessa construção, torna-se fundamental a dinâmica e atuação de um centro de apoio ao pesquisador. Ao desincumbir-se de tarefas administrativas e contábeis, por exemplo, o pesquisador poderá então dedicar mais energia e tempo à exploração científica. Também para a ciência, tempo é dinheiro.

Todo pesquisador, desde o início de sua carreira, percebe a necessidade de contar com financiamento e com recursos – financeiros e humanos – para desenvolver projetos com qualidade e certa tranquilidade. Assim sendo, para mais informações sobre gestão e aplicação de conhecimentos, habilidades e técnicas para a execução de projetos de forma efetiva e eficaz, possibilitando novas pesquisas, o Centro de Apoio à Pesquisa no Complexo de Saúde da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAPCS-UERJ) recebeu a gerente de projetos Juliana Juk, que atua junto ao Departamento de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP) e junto ao Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês.

Vejamos, portanto, orientações [geradas na oportunidade de sua visita] no sentido de aprimorarmos práticas ligadas ao gerenciamento de projetos de pesquisa.

 


CAPCS-UERJ – Em síntese, quais as características de um bom gestor de projetos…

Juliana Juk – Conceitualmente, diz-se que o bom gestor é àquele que possui a capacidade de ‘ser o maestro da orquestra’. A gestão de projetos deve ser feita por pessoas capazes de entender a lógica da ciência, um grande desafio, sem dúvida, que requer estudo constante, vivência em diferentes áreas, instituições, projetos. Talvez essa bagagem [em diferentes instituições, projetos, experiências] represente o conhecimento mais rico que um gestor pode apresentar. E acredito que se nos organizarmos, desenvolvermos e aproveitarmos uma rede voltada para a construção, seremos cada vez mais produtivos.


CAPCS-UERJ – A burocracia. Sem dúvida, trata-se de um obstáculo que acaba por esvair tempo e energia do pesquisador. Qual(is) a(s) principal(is) medida(s) de desburocratização que deveriam ser tomadas pelas agências de fomento à pesquisa ou pelos órgãos que financiam a pesquisa?

Juliana Juk – Estudos recentes mostram que cientistas gastam mais de 30% do tempo de estudo com burocracia dos projetos. Entre as medidas de desburocratização necessárias, segundo estudos neste campo, estão: menos formalidades, menos papéis etc.; dar prioridade aos resultados dos projetos; simplificação na prestação de contas; maior flexibilidade na troca de rubricas do plano inicial; entre outras.


CAPCS-UERJ – Então, percebemos o valor de um escritório [ou centro] de apoio ao pesquisador. É correto portanto considerarmos que, para o êxito final de um projeto de pesquisa, o trabalho eficaz de um escritório de apoio seja vital no processo?

Juliana Juk – Sim, sem dúvida. Hoje aumenta a necessidade de um staff dando suporte ao pesquisador. Ele precisa do jornalista, que é o profissional que irá cuidar da escrita, da comunicação e adaptação da informação científica ao formato de notícia que seja compreensível pela sociedade; precisa do web designer, que é o profissional da criação, da técnica e do cuidado com as redes sociais e marketing digital; precisa do bibliotecário, para a busca, formatação e seleção da informação especializada; precisa do estatístico, do profissional que faça análise de dados, do profissional que conheça revisão sistemática; precisa do profissional que cuide das contas e de toda dinâmica administrativo-financeira; enfim, hoje uma pesquisa bem sucedida precisa do trabalho de uma equipe multiprofissional e plenamente integrada a um objetivo em comum. Vejo aqui no CAPCS-UERJ um belo exemplo disso.


CAPCS-UERJ – O que precisamos ter em mente para atingirmos o tão desejado “aprovado” aos nossos projetos…

Juliana Juk – Mais de 60% das propostas são rejeitadas, segundo estimativas, devido à proposta estar em desacordo com o programa e por ter sido realizada submissão do projeto não seguindo as regras estabelecidas em edital. Parece simples, mas é bem complexo. Por isso, é fundamental estar atento e conhecer as oportunidades; criar o hábito de ler projetos aprovados [que irão abrir nossa mente e despertar a percepção para muitos pontos]; avaliar bem o(s) projeto(s) que queremos submeter; não ter medo de tentar a submissão; juntar-se a equipes de sucesso; saber dizer não, quando necessário; identificar bem os stakeholders – público-alvo; adaptar o projeto ao ‘tipo’ de recurso disponível; e sempre envolver as pessoas. Trazer apoiadores à nossa causa é fundamental.


Captação de recursos


CAPCS-UERJ – Qual o primeiro passo…

Juliana Juk – É preciso se ter em mente com exatidão as etapas de um projeto. Vivemos hoje um cenário acadêmico cada vez mais competitivo, e de recursos disponíveis sim, mas há que considerarmos que a demanda é grande, então não basta elaborar uma proposta consistente e inovadora. É preciso também ter clareza sobre quanto cada projeto, em suas distintas etapas, irá custar. Organizar bem as ideias é o primeiro passo. Uma estimativa orçamentária criteriosa é fundamental quando se busca financiamento para um projeto de pesquisa. Recomenda-se que os pesquisadores só comecem a esboçar a proposta orçamentária após ter uma ideia clara sobre seus objetivos e metodologias.


CAPCS-UERJ – O recurso poderá vir-nos sob que formas?

Juliana Juk – Sob a forma de capital – móveis; equipamentos; veículos; livros; softwares. Sob a forma de custeio – serviços de terceiros; material de consumo; diárias; passagens; softwares também. E sob a forma de bolsas – pós-graduação; iniciação científica; pesquisa.


CAPCS-UERJ – Onde, hoje, captarmos os recursos?

Juliana Juk – CNPq, CAPES, FAPs, Finep, Ministério da Saúde – Fundo Nacional de Saúde, Organização Pan-americana (OPAS), indústrias farmacêuticas, recursos internacionais, atividades educacionais, eventos, doações privadas… São muitas as frentes e há um amplo leque aos pesquisadores. Mas é preciso estar atento às especificidades de cada agência de fomento. Há que ser feita uma boa prospecção de oportunidades e uma correta leitura das propostas. Cada uma tem suas próprias regras, as quais podem mudar de acordo com cada tipo de chamada ou edital. Ler atenta e criteriosamente os editais é fundamental.


CAPCS-UERJ – Dê-nos, por favor, outras orientações quanto ao gerenciamento do escopo de um projeto?

Juliana Juk – São necessários: elaboração de relatórios parciais; estar sempre muito atento com relação ao cronograma; incorporação de novas perguntas; Gold Plating [adicionar ao escopo do projeto novas funcionalidades ou entregas que não foram solicitadas, o ‘algo a mais’ que pode fazer a diferença]; registro detalhado das alterações que porventura surjam, seu andamento e seus impactos; buscar a aprovação do concedente; cada ação ou mudança ser muito bem avaliada – ‘Pra que fazer isso?’-, indagarmos sempre no processo.


 

Equilíbrio no orçamento


CAPCS-UERJ – Fale-nos, por favor, sobre fiscalização e normatização dos projetos, a cada dia mais criteriosas.

Juliana Juk – Sim, hoje temos os órgãos de controle muito mais atentos. Há uma grande burocracia, com uma igualmente considerável fiscalização para tal. Temos uma normatização muito mais rígida, com um grande nível de detalhamento. É preciso que os gestores de pesquisas se organizem muito bem, registrem todo fluxo de caixa e arquivem todos os recibos e comprovantes de compra de equipamentos, reagentes e demais. Tudo precisa estar muito bem guardado e registrado. Então, aumenta, e muito, atualmente, a necessidade de o pesquisador ter pessoas que deem esse vital suporte às ações inerentes à pesquisa.


CAPCS-UERJ – Na elaboração de orçamentos, equilíbrio é, portanto, a palavra-chave?

Juliana Juk – Sim, os pesquisadores devem sempre buscar a submissão de propostas orçamentárias equilibradas. Despesas superestimadas podem depor contra o projeto. Não são indicados ‘projetos megalomaníacos’. Ao passo que subestimar os custos do projeto também pode comprometer a pesquisa que, no limite, corre o risco de ser interrompida ou não concluída. Lucidez e equilíbrio são os caminhos.


CAPCS-UERJ – O que causa uma boa impressão na submissão de um projeto?

Juliana Juk – Ter uma proposta orçamentária bem detalhada, plausível, coerente, sem dúvida alguma irá indicar aos avaliadores que o pesquisador se empenhou na elaboração de seu projeto e tem clareza de todas as etapas e componentes necessários para cumprir seus objetivos. Causará ótima impressão.


CAPCS-UERJ – Criar um orçamento, por assim dizer, então é uma verdadeira ‘arte’.

Juliana Juk – Sim. O cuidado precisa ser redobrado sempre. Reveja as orientações do edital; certifique-se que os itens financiáveis atendem suas necessidades; certifique-se que os itens vedados não inviabilizam suas necessidades; seja realista; releia as regras, releia mais uma vez e quantas vezes possíveis…


CAPCS-UERJ – Escrita. Cite-nos algumas orientações para a escrita de um projeto…

Juliana Juk – Seguir as regras de aplicação da proposta. Objetivos e metas possíveis e mensuráveis. Texto centrado no patrocinador, tempo verbal futuro, o texto precisa ser persuasivo [provar a importância do projeto], convincente [vender bem sua ideia], orientado para resultados, numa linguagem acessível e com menor número de páginas possíveis. E uma orientação que considero importantíssima também é submeter para revisão daqueles que não participaram da construção do projeto. Uma boa avaliação de alguém “de fora” do projeto é sempre algo a se considerar e enriquecedor.


CAPCS-UERJ – Quais instituições poderão nos guiar no gerenciamento de projetos… Onde encontrar conteúdo de apoio?

Juliana Juk – De um modo geral, as universidades nos Estados Unidos trabalham com estruturas incríveis, organizadas em times com diferentes habilidades para auxiliar os pesquisadores no gerenciamento das pesquisas. Cito aqui algumas instituições de apoio: a SRA Internacional – Society of Research Administrators Internacional. A SRA é uma instituição que reúne administradores de pesquisa de diversas universidades do mundo; a University of Central Florida; a Associação Brasileira de Gestores de Pesquisa (ABGEPq); a Brazilian Research Administration and Management Association (BRAMA). Cito também a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – que possui treinamento para escritório de apoio ao pesquisador; há também alguns manuais de prestação de contas disponíveis online; podemos também pesquisar e estarmos atentos a alguns webinars – seminários online – disponibilizados pela Organização Pan-americana da Saúde (OPAS). Ressalto também a Project Management Institute (PMI), que nos mostra que gerentes de projetos são agentes de mudanças, que trabalham bem sob pressão e se sentem confortáveis diante de mudanças e da complexidade de ambientes dinâmicos.


CAPCS-UERJ – Concluindo, o que gostaria de deixar bem claro aos pesquisadores, gestores de projetos e aos profissionais de diferentes áreas que nos leem neste momento?

Juliana Juk – Faça valer cada centavo e cada segundo de investimentos em sua carreira. Como? Buscando conhecimento, trocando experiências, compartilhando.  A multiplicação é exponencial. E tem uma frase, de Jean Cocteau [poeta, romancista, cineasta francês, 1889-1963], que gosto muito: “Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez”.



Por Felipe Jannuzzi

Jornalista do CAPCS-UERJ